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POR AMOR AOS ORIXÁS - ANO III

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quinta-feira, 13 de maio de 2010

Nações Ketu Jeje e Angola

O CANDOMBLÉ COMO SISTEMA DE TRANSMISSÃO DE IDENTIDADE
A iniciação ritual no Candomblé é um processo de construção de uma identidade psicológica permanente entre o participante e a entidade. Ao contrário do desenvolvimento mediúnico da concepção espírita - em que o médium renuncia a própria subjetividade em favor da subjetividade de um desencarnado - o transe de incorporação no Candomblé tem por objetivo principal o auto-reconhecimento recíproco entre o ‘santo’ e seu ‘filho’, o reatamento simbólico do mundo dos homens (Ayé) com o mundo dos deuses (Orum).

Este processo de identificação simbólica entre os participantes e os Orixás não existe apenas no momento privilegiado do transe ritual; a identidade entre o iniciado e seu santo corresponde a incorporação psicológica permanente das características do orixá na personalidade de seus filhos. Esta identidade instaura-se não só através da iniciação e se desenvolve lenta e gradualmente nos transes, mas também é reforçado periodicamente nas obrigações sucessivas e renovada nas festa públicas dos santos, quando toda a comunidade presente se torna testemunha e fiadora desta aliança e dela se beneficia.

Os rituais do Candomblé consistem basicamente de um conjunto de temas arquetípicos - a representação\incorporação de forças naturais personificadas em comportamentos e estórias - que se sucedem durante a cerimônia. Cada entidade se manifesta através de um transe característico, produzido por imagens, sons, cheiros, gostos, danças, ritmos, cores, trajes e adereços específicos. Invocados através de danças extáticas e de três tambores cerimoniais (rum, rumpi e lé), os deuses africanos incorporam em seus ‘filhos’, fazendo-os re-dramatizar os grandes feitos míticos e lendas: a luta dos irmãos Ogum e Xangô pelo amor de Oxum, a viagem de Oxalufã ao encontro de seu filho Xangô, as aventuras amorosas de Yansã ... As entidades são, ao mesmo tempo, fundamentos psíquicos de comportamentos humanos e forças místicas da Natureza; e são representadas nos rituais como identidades sagradas que se manifestam dentro de uma estrutura mítico-litúrgica de interpretação do mundo.

Não se trata, portanto, de uma encenação teatral ou de uma catarse histérica: neste psicodrama mítico há uma ‘economia energética’, onde forças espirituais são manipuladas e manipulam os corpos dos participantes, em um espetáculo coreográfico que associa imagens-tema a ritmos determinados. Essas associações audiovisuais são produto e instrumento de um processo de construção de uma identidade simbólica, que vai de acordo com a tradição cultural de cada Nação do Candomblé e com a força-entidade invocada, como veremos adiante.

NAÇÃO KETU-NAGÔ-ORIXÁ
OLORUM ou OLODUMARÉ

1-OXALÁ
2-OGUM
3-OXÓSSI
4-OMULU
5-XANGÔ
6-YANSÃ
7-OXUM
8-IEMANJÁ
9-OXUMARÉ
10-OSSAIM
11-EXÚ/IROKÔ
12-NANÃ BURUKÊ


NAÇÃO JEJE-FON (VOODUM)
MAVU LISSA
1-OLISSA
2-GU
3----------
4-SAPATÁ
5-SOBÓ
6-OIÁ
7-AZIRI TOBOSSI
8-ABÉ
9-BESSÉN e DÃ
11-LOKO
12-NANAMBIOCÔ


NAÇÃO ANGOLA-CONGO (INQUICE)
ZAMBI ou ZANIA POMBO
1-LEMBÁ ou LEMBARENGANGA
2-SUMBO MUCUMBE
3-MUTALAMBÔ ou TAUAMIM
4-CAMBARANGUAJE ou ZAZE
5-BURUMGUNÇO ou CUQUETE
6-QUICIMBE ou CAIALA
7-BANDALUNDA
8-ANGORÔ
10-CATENDE (CAIPORA)
11-TEMPO
12-QUERÊ-QUERÊ

O que se pode perceber em uma rápida comparação das três NAÇÕES é que:

 nos Voduns e nos Inquices estão não apenas as mesmas forças místicas que formam os Orixás nagôs, mas também outras forças e outros conceitos.
No caso dos Jeje, existentes no Haiti, em Cuba e no estado brasileiro do Maranhão, os Voduns cultuados são em número maior que os orixás mais conhecidos habitualmente no culto Iorubá. Os Voduns podem ser divididos em homens e mulher; e, dentro destes, em moços e velhos, somando um total de quarenta entidades. Já no caso dos ritos bantos, há, devido a outra concepção acerca da ancestralidade, entidades provenientes da mitologia indígena e também a presença de diversos tipos de espíritos de mortos (caboclos, preto velhos, crianças, índias).

Na África, as ‘nações’ eram identidades étnicas de diferentes grupos geográficos. Porém, o termo ‘nação’ no contexto do candomblé brasileiro significa um grupo cultural com tradições próprias intrínsecas de culto. Há, portanto, uma diferença acentuada entre a identidade étnica das ‘nações africanas’ e a identidade cultural das ‘nações do candomblé’ no Brasil. De uma forma geral, podemos dizer que o modelo ‘Jeje-Nagô’ é predominante no Candomblé brasileiro. Ele é o mais tradicional, o menos permeável a mudanças e influências culturais, o mais próximo do modelo africano original ainda hoje existente na Nigéria. Em oposição a esta tendência tradicionalista do modelo Jeje-Nagô, o grupo cultural dos Bantos (nações de Angola e Congo) foi o que mais se sincretizou. Os Bantos, mesmo depois de um primeiro momento de autonomia religiosa e embora conservassem o nome original de certas entidades de origem congolesas, viram seus rituais progressivamente desagregarem, para dar lugar ao sincretismo afro-ameríndio (Catimbó, Candomblé de Caboclo, a pajelança e o culto a entidades indígenas) e ao afro-espírita (Jurema, Umbanda) ou se adaptaram as regras ditadas pelos candomblés nagôs, não se distinguindo destes senão por seus cantos mesclarem o banto com o português em louvores a ‘Zambi’.

Assim, se o Candomblé é uma manifestação da identidade cultural dos negros no Brasil, pode-se notar facilmente a existência de uma linha de desenvolvimento angolana em oposição a uma linha nagô. A primeira, incorporando a ancestralidade indígena e mestiça, é responsável por novas formas de identidade social dentro da realidade brasileira; e a segunda, ao contrário, procurando cada vez mais se africanizar, cultuando exclusivamente os orixás e mantendo as cerimônias com os espíritos dos mortos (ou antepassados) restritas aos ritos secretos da Sociedade dos Eguns Ilê Agbouça, na ilha de Itaparica (BA).

Além dessas variações culturais das referências simbólicas segundo as nações - que, no Brasil, se diversificam em milhares de seitas e cultos multisincretizados sob a hegemonia Jeje-Nagô - há, ainda, uma variação simbólica referente a cada entidade dentro de um mesmo ritual, onde os referentes são organizados de modo a caracterizar a identidade de cada orixá. Cada ‘Santo’ tem sua cor, suas músicas, sua dança e, ao mesmo tempo, corresponde a um tipo de comportamento humano específico e a uma faixa vibratória da Natureza. Cada entidade é um feixe de referentes simbólicos. No Xireé, a ordem sequencial de apresentação durante o ritual é quando melhor se observa como os Orixás formam as freqüências de rede do Candomblé enquanto linguagem simbólica: no início as vibrações mais densas e ctnônicas; no final, as mais desmaterializadas e distantes. Trata-se, como dissemos, de reunificar o Ayé (Mundo do preto e vermelho) ao Orum (universo luminoso do branco), passando por todo espectro de vibrações/entidade intermediárias.

O modelo Jeje-Nagô ou baiano apresenta, geralmente, dezesseis orixás principais: Exú, Ogum, Oxossi, Ossaim, Xangô, Iansã, Oxum, Obá, Nanã Burukê, Omulú, Oxumaré, Iroko, Ibeji, Logunedé, Yemanjá e Oxalá. Antes porém de estudarmos como se organizam os referentes simbólicos (alimentares e audiovisuais) no sistema divinatório do Ifá, precisamos definir melhor o que é uma linguagem simbólica e o seu papel nas culturas orais.



Ketu, Jeje ou Angola?
Qual é a sua nação?

Antes mesmo das idéias de hobsbawn sobre o conceito de nação, o negro "brasileiro" se entendia como pertencendo a uma nação, não pela sua origem étnica, mas em um conceito teológico no qual ele estava ligado através de sua iniciação religiosa.
Ao longo dos anos, esse conceito foi sofrendo transformações devido às relações de trocas entre representantes das distintas nações religiosas (quero ratificar que toda vez que eu usar o termo nação sugerindo o contexto religioso, estou me referindo a Ketu, Jeje e Angola). Essas relações de trocas e a necessidade de legitimidade por parte de alguns líderes religiosos deu início a uma mistura, ou um sincretismo entre as diferentes entidades africanas cultuadas no Brasil.
E isto se reflete até hoje nas casas de Candomblé de todos os cantos do país. Desde as mais tradicionais às recém fundadas.
Entidades foram rebatizadas ou adaptadas para que pudessem ser cultuadas em casas cuja nação de origem não tinha ligação a tais entidades, com o propósito de garantir respeito e poder, além da já referida legitimidade.
Se pegarmos o exemplo do rei Agajá do Danxomé, perceberemos que, misturar entidades não é coisa de brasileiro, e que, os puristas da atualidade estão cometendo um grande equívoco em criticar os que cultuam entidades de nações distintas das que suas casas se propõem. Ainda, se estudarmos os contextos das irmandades de pretos, podemos entender tal ato como uma estratégia política, mas como isso exige uma discussão mais prolongada, penso que não vem ao caso entrarmos nesses detalhes.
Qual a distinção e quais as semelhanças entre algumas entidades africanas, das nações Jeje, Ketu e Bantu? Vamos ver um quadro comparativo e fazer uma reflexão.


Semelhanças entre os Vodun, Orixás e Nkise.


KETU
JEJE
ANGOLA

Èxù

Ogun

Osayin

Oxumare

Xangô

Obaluwaye

Oxum

Orixanlá
Elegba

Gu

Ague

Dan/Becem

Badé/Kevioso

Azonce

Aziri

Liça
Panbongera

Nkosi/Mokunbe

Katende

Angoro/angoromea

Zaze Luango

Kaviungo

Dandalunda

Zambi


Apesar de nomes diferentes, as entidades apresentadas no quadro acima possuem os mesmos atributos. E, em muitos casos, suas oferendas votivas são as mesmas, apenas com nome correspondente a nação cultuada.
Além das entidades, no culto do Candomblé acontece uma mistura de idiomas, não existindo uma exclusividade desta ou daquela nação, é comum aos iniciados, independente de seu seguimento, se denominarem "vodunsi", sendo esta palavra de origem fongbe, somente deveria ser empregada aos iniciados da nação Jeje, ou ainda, usar o termo iyawo, para denominar um iniciando de qualquer etnia, quando esta palavra pertence ao vocabulário ioruba (Ketu) e quer dizer esposa do orişa, e por fim, usar "maianga" denominando banho, mas esta palavra é de origem banto (angola). O sincretismo entre estas três nações é perfeitamente aceito, por se tratar de povos de origem semelhantes, sendo separados apenas por seus idiomas. O que é questionável nos dias de hoje é o sincretismo com os santos da igreja católica, que distorcem todo o sentido destas culturas. Classificando Èxú, como diabo, Pombongera como prostituta, Oyá como Santa Bárbara, Ògún como São Jorge, etc., quando não há muita das vezes se quer, nenhuma correspondência entre eles.
O candomblé brasileiro, é um culto à natureza e que visa a integração do homem com o meio ambiente, buscando o encontro consigo mesmo para então, conseguir realizar os seus desejos, através do seu próprio entendimento.
Segundo se sabe, na África cada cidade ou aldeia possuía ou ainda possui uma entidade, sendo esta, a única adorada entre todos os moradores daquela localidade.
Existem também as entidades de culto universal, como é o caso de Exú, Ifá e Xangô.
Questões sociais e políticas da época do Brasil-colônia, ligadas às outras questões que aconteciam na África, levaram à unificação de vários cultos, formando o culto coletivo que mais tarde seria denominado Candomblé.
Enquanto na África, muitos cultos são feitos ao ar livre, no Brasil, por questões históricas e sociais, o culto se realiza em um espaço sagrado, o terreiro ou roça e na maioria das vezes, as cerimônias são restritas aos seguidores. Essa forma brasileira de culto é o resultado da resistência negra diante da sua situação social no Brasil.
Por se tratar de uma religião iniciática, a pessoa está sempre se iniciando a uma nova fase dentro do culto, o que implica em novos aprendizados e uma nova postura diante das pessoas e das coisas. Por isso só participam de determinadas cerimônias, as pessoas devidamente preparadas e capacitadas.
É necessário um espaço apropriado que deverá ser preparado, para que, a partir de então passe a possuir a força que emana de todos os elementos da natureza que tenham adoração no culto. Essa força é chamada de Axé, palavra que possui várias interpretações, todas significando coisas boas, força e poder.
Tudo o que existe na natureza está munido de axé. Isso nos permite entender os elementos da natureza e usá-los para os vários fins, que o candomblé nos possibilita.
Através das cerimônias e outros rituais, como ebós, banhos entre outros, os sacerdotes e sacerdotisas do candomblé têm o conhecimento de manipular a energia que vibra em uma pessoa ou coisa, tornando evidente o seu axé e assim trazendo, depois do sacrifício, a bem aventuraça.


Quando usamos o termo Candomblé, generalizamos assim, as distintas nações africanas que compõem esse culto no Brasil. Já foi levado em consideração neste espaço, que a Nação que se sobressai, pelo menos em nível de pesquisa acadêmica, é Nação Nàgó-Ketu (ioruba), mas é preciso ressaltar que o Candomblé não se constitui apenas desta nação. Existe ainda a Nação Jeje e a Nação Angola.

Mas o que diferencia estas Nações entre si? Sabemos que a principal razão destas diferenças se deve ao variado número de etnias africanas que chegaram ao Brasil com o comércio de escravos. Junto com os iorubas e Daometanos, chegaram ao Brasil também os Angolanos e Malês, entre outros.
Apesar das semelhanças entre as nações de Ketu e Jeje, inclusive por questões culturais e geográficas, no Brasil, há uma resistência em "unificar oficialmente" estas duas nações. Embora uma cultue a entidade da outra em seus terreiros. Por exemplo: os orìṣà Naná, Oṣùmaré, Ọmọlù, Iroko, Ewà, são de origem Dahomeana mas são cultuados em casas de Ketu. Enquanto Oyá por exemplo é uma entidade anàgónun (nàgó) e é cultuada em casas de Jeje.
Já o que se observa entre as Nações Angola e Kongo, é que houve uma espécie de unificação entre essas duas nações, embora haja algumas diferenças entre elas, as semelhanças falaram mais forte, principalmente a semelhança lingüística. Enquanto a Nação Angola fala Kimbundu, a Nação Kongo fala Kinkongo. São semelhantes mas não são iguais, por exemplo: os Orìṣà e Vodun, são chamados de Mukixes para os angolanos e Inkices para os congoleses. Os ritmos sagrados da Nação Kongo-Angola são Kabula, Barra Vento, Kongo d'ouro, Muzenza, entre outros. Os atabaques, Ngoma, são tocados com as mãos. Não há uso de varetas (agdavi ou atori).
Enquanto isso, assistimos às pessoas de Ketu e Jeje, discutindo sobre uma suposta purificação, que nunca houve, desde que o Candomblé foi estruturado no Brasil. Hoje, a internet está cheia de "sabe-tudo", pessoas que reproduzem na íntegra textos acadêmicos, quando muitos destes textos foram escritos por pesquisadores que sequer pisaram em um terreiro de candomblé, seja ele de ketu ou jeje.
Sabemos que as diferenças ente Ketu e Jeje são mais de cunho político que religioso e têm origem na formação dos Estados africanos relativos a estas etnias. Mas quando o assunto é a religião Candomblé, acredito que devem-se ampliar os debates sobre estas diferenças a fim de consolidar definitivamente a religião que surgiu no Brasil e que há muito já deveria ser a religião oficial deste país.
Certos discursos servem apenas para separar cada vez mais os adeptos do Candomblé e não contribui em nada para o crescimento do culto ou desenvolvimento de seus praticantes e seguidores.



sites:
http://ohermeneuta.tripod.com/ANA74.html
http://ahoboboy.blogspot.com/2010/02/ketu-jeje-ou-angola.html

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